Ideias Livres

quinta-feira, junho 30, 2005

A destruição da indústria nacional - causas de um crime

Ontem, no canal 1 num debate entre Carvalho da Silva, da CGTP, um representante da UGT que não João Proença nem Rui Oliveira e Costa - o que é espantoso - e o ministro do Trabalho e Segurança Social, Vieira da Silva, Carvalho da Silva criticou o encerramento de toda a grande indústria nacional como se tal fosse culpa do "grande capital", como aprendeu nas cartilhas do partido, esquecendo-se que essa mesma indústria funcionava bem antes de ser totalmente nacionalizada e dominada por administradores públicos que mudavam ao sabor dos governos eleitos. Os "Mello e os Champalimaud", como foram apelidados pelos comunistas os grandes industriais portugueses do século XX, construíram impérios que davam emprego a milhares de pessoas, com condições sociais acima da média.

Foi o Estado português quem deixou destruir o valor criado, com falta de investimento, não modernizando as unidades fabris e aumentando artificialmente salários sem o respectivo aumento de produtividade. Mais uma vez se provou a péssima capacidade do Estado para gerir negócios, a qual, associada à total nacionalização da grande economia portuguesa após o 25 de Abril conduziu à decadência e subsidiodependência da mesma, que foi sendo ocultada com dinheiro europeu e com as privatizações iniciadas na segunda metade da década de 80. Porém, para boa parte da indústria pesada, era tarde demais, pois entre 75 e 85 a indústria mundial sofreu brutais reestruturações processuais - ver, por exemplo, The Chemical Industry at the Millennium, de Peter Spitz - não acompanhadas pelas empresas portuguesas. Esse atraso foi suficiente para aniquilar as possibilidades nacionais no competitivo mercado mundial. Os pólos industriais de Sines, Barreiro e Estarreja, que podiam ter criado colossais clusters industriais, nunca foram desenvolvidos e todos nós vamos sofrendo na pele os devaneios ideológicos de uma geração.

quarta-feira, junho 29, 2005

O aborto como joguete político do PS

Pela enésima vez, a questão do aborto voltou à ordem do dia.

Posta de parte por um PS que se pretendia fotogénico perante os parceiros europeus, é agora rapidamente recuperado após o adiamento do referendo ao tratado constitucional europeu.

A discussão do aborto serve ao PS como anestésico político. Voltar a colocá-la como tema central da política nacional seria fazer esquecer os graves problemas económicos que o país atravessa, fazer esquecer os maus resultados que as sondagens dão ao Partido Socialista nas eleições autárquicas, dificultar o papel de Cavaco Silva enquanto candidato presidencial, devolver ao PS algum elan perdido por ter tido de sujar as mãos com temas tão mesquinhos como sejam as finanças públicas, perante os cidadãos e perante os restantes partidos de esquerda.

Veremos se o consegue fazer. Se tal suceder e conseguir não só efectuar - e vencer - o referendo mas também obter trunfos políticos para outros embates eleitorais, o principal responsável e derrotado será o PSD, que sob a liderança de Marques Mendes tem tido um papel bastante apagado na discussão política. E a este propósito será bom não esquecer o excelente desempenho de Marcelo Rebelo de Sousa, há 9 anos atrás, à frente dos destinos do partido, numa situação semelhante à actual mas, dadas as condições económicas do país à data, ainda mais difíceis para o PSD.

segunda-feira, junho 27, 2005

Os Extremos tocam-se?

Segundo esta notícia, os Jovens do Bloco, reunidos no seu acampamento da Serra da Estrela, qual Viriato contra os romanos, irão ensinar "técnicas de desobediência civil como artes murais, circenses e equilibrismo."

Numa sociedade livre, não vejo nada de errado em relação a isto. Acho tão aceitável como se visse a seguinte notícia: "Jovens Nacionalistas, reunidos no seu acampamento em Sagres, irão ensinar técnicas de desobediência civil como coros patrióticos, vitrinismo disruptivo em lojas étnicas e marchas nacionalistas."

domingo, junho 26, 2005

Irão - A democracia não basta


A vitória do ultraconservador Mahmoud Ahmadinejad, na segunda volta das eleições presidenciais iranianas, face ao ex-presidente Rafsanjani, contestada por algumas partes intervenientes,indicia à primeira vista uma provável diminuição das liberdades individuais dos iranianos. Nos últimos anos, o Irão tem assistido ao recrudescimento de alguns movimentos que procuram um aumento dos direitos de cidadania da população em geral e, em especial, das mulheres. O presidente Khatami pareceu mesmo apoiar algumas destas tendências. Porém, o braço religioso do regime, o Conselho dos Guardas, com poder de veto legislativo, tem impedido qualquer atitude reformista, mantendo o Irão no grau zero das liberdades individuais sociais e económicas, como se pode ver no Index of Economic Freedom 2005, da Heritage Foundation.

Sobre o Irão e a sua história contemporânea, ler "Persépolis", de Marjane Satrapi, uma banda desenhada autobiográfica premiada, sobre a vida no Irão antes e depois da Revolução de 1979 e também "Para Além da Crença", de V. S. Naipaul, editado em Portugal pela Dom Quixote, que nos dá uma excelente perspectiva do que significa, hoje, viver no Irão.

sábado, junho 25, 2005

Ideias Livres para Portugal - nº 2

Simplificação e transparência do sistema fiscal

O sistema fiscal português é hoje, ao fim de séculos e séculos de tributação, um complexo emaranhado de diversas formas de extorsão. Temos assim o IRS, o IRC, o IVA, o IA, o ISP, o Imposto de Selo, o IMT, o IMI e uma miríade de impostos especiais sobre o consumo - jogo, álcool e tabaco, por exemplo.

Os dois primeiros, IRS e IRC, são impostos sobre os rendimentos, o IVA, o IA, o ISP, o IMT e os vários impostos especiais são impostos sobre o consumo, podendo mesmo ser acumulados, dando azo a casos de dupla tributação, enquanto o(s vários) Imposto(s) de Selo e o IMT são impostos vários sobre a propriedade privada, sobre a autenticação de documentos, etc.

Num país com um elevado desequilíbrio da balança comercial, em que o consumo é largamente superior à produção e criação de valor, a tributação deveria incidir unicamente sobre o consumo.
Uma reestruturação profunda das funções do Estado, fora do âmbito desta posta, é condição sine qua non para o aumento da produtividade e competitividade da economia portuguesa e para o combate à injustiça social, hoje francamente visível e fonte de múltiplos conflitos, na desigualdade de condições entre o sector privado e o público e na diferença de qualidade entre os serviços públicos e os privados. Só um Estado mais pequeno se poderá concentrar nas suas reais funções. Mas isso será motivo de outros comentários futuros.

Porém, mesmo analisando o Estado pelo que ele é hoje, uma reestruturação completa do sistema fiscal permitiria aos cidadãos e ao Estado um melhor entendimento mútuo dos seus papéis, visto que uns e outros são as duas faces de uma mesma moeda.

A abolição do IRS e IRC e respectiva compensação por aumento proporcional do IVA - bom, um pouco abaixo do proporcional, para obrigar o Estado a apertar um bocado mais o cinto... - colocaria o ónus da subsidiação do Estado do lado do consumidor e não do trabalhador.

Analisando a Execução Provisória da Receita do Subsector Estado, verificamos que o IVA corresponde aproximadamente à soma do IRS e do IRC. Assim, o fim do IRS e do IRC colocaria nos bolsos dos cidadãos muito mais dinheiro, de onde só teria de sair na medida das suas vontades.

Por princípio, considero que não deveriam existir escalões de IVA, pois não cabe ao Estado definir as prioridades pessoais de cada cidadão. Do mesmo modo, considero que, para os imóveis, deveriam extinguir o recém-criado IMT, passando a cobrar IVA. Isso aumentaria bastante o preço final dos imóveis, pelo que poderia ter de existir um período de transição de modo a criar as menores distorções possíveis no mercado.

Esta medida provocaria uma clara mudança de comportamento dos cidadãos, incentivando a poupança e o investimento em detrimento do consumo. Não provocaria, porém, um travão súbito no consumo, pois como vimos, mantendo os seus hábitos de consumo os cidadãos acabariam com o mesmo dinheiro.

A principal dificuldade, ao explicar uma medida destas, passa normalmente por dar a compreender o porquê da eliminação do IRC. Uma boa parte da nossa população, por razões culturais, tem hoje uma abordagem contraproducente em relação às principais criadoras de riqueza da nossa sociedade: as empresas. Para eles, eliminar o IRC será apenas criar mais lucros, que ávidos e rechonchudos capitalistas queimarão em fogueiras enquanto assistem à morte de milhões de famintos. A falta de instrução conduz a uma incapacidade de boa parte da população para compreender os mecanismos racionais dos agentes económicos, isto é, nós. Uma empresa, ao, imagine-se, duplicar os seus lucros, tem três alternativas, que podem ser utilizadas em conjunto: 1 - reinveste esse capital na própria empresa, que em última análise chegará em parte ao Estado sobre a forma de IVA; 2 - distribui prémios pelos trabalhadores; 3 - distribui dividendos pelos seus accionistas. A primeira e a segunda hipóteses são rapidamente compreendidas como vantajosas para a sociedade. Quanto à terceira, vejamos: o accionista, ao receber mais lucros, poderá fazer duas coisas com eles: 1 - reinvesti-los em outros negócios que tenha ou em potenciais oportunidades que surjam, funcionando como capital de risco; 2 - "esbanjá-lo", pagando o respectivo IVA ao Estado.

Os restantes impostos deveriam ou ser convertidos em IVA ou extintos. Aberrações fiscais como o imposto de selo, que não passa de uma "portagem administrativa" - e que pode atingir milhares de euros, dependendo do seu âmbito - ou o IMT, um verdadeiro atentado à propriedade privada, deveriam acabar o mais depressa possível.

Como vimos, estas medidas trariam claras vantagens ao sistema fiscal, simplificando-o e moralizando-o, reaproximando o Estado dos cidadãos e auxiliando o primeiro a compreender as suas razões de ser.

A Personalização da Declaração de IRS

Os impostos são, pela própria definição, uma medida à qual a população, por não compreender a razão directa do seu esforço financeiro, tenta fugir sempre que pode. E tanto mais acontecerá quanto mais imperceptível for a sua utilização última. No fundo, o bolo das receitas do Estado servirá para pagar o bolo das despesas do Estado. Bom, mais ou menos, com uma ligeira diferença de 3 a 7% a favor das despesas, a que vulgarmente se chama défice.

Idealmente, cada contribuinte deveria ser informado, pessoalmente, do destino dos seus impostos. Deveria receber uma carta em casa dizendo:

"Caro contribuinte,

a sua contribuição em sede de IRS referente ao ano de 2004 teve o seguinte destino:

Salários de Professores - 180 euros
Salários de Médicos - 87 euros
Investimento em infra-estruturas desportivas - 35 euros"

e por aí adiante até a soma equivaler a minha contribuição, por via da taxação do meu trabalho, para o Orçamento do Estado.

Claro que algumas pessoas ficariam indignadas por não quererem pagar os estádios do Euro 2004 com o suor do seu trabalho. Para uma pessoa que aufira mensalmente 1000 euros brutos, esses 35 euros representam cerca de 5,5 horas de trabalho. Mais de meio-dia para ajudar a construir, por exemplo, o Estádio do Algarve, que faz 4 ou 5 jogos por ano...

Deveríamos também poder indicar quais as áreas onde pretendemos ver o nosso dinheiro utilizado. Podermos assumir que não pretendemos usufruir do direito ao Sistema Nacional de Saúde, em virtude de termos um seguro privado, pagando apenas uma pequena parcela para permitir àqueles que não têm condições pessoais que tenham cuidados básicos de saúde.

O Estado não deveria poder subsidiar qualquer organização privada a não ser com a indicação expressa de cada doador em relação à entidade em causa. Com um simulador online seria possível, inclusive, a apresentação das várias organizações. Claro que, na realidade, nada disso deveria sequer existir, pois o dinheiro em causa pertence ao cidadão que trabalhou para o merecer, mas sempre seriam formas de dar um rosto ao aparelho fiscal.

Já que a taxação do trabalho é um dos pilares do sistema tributário moderno, então que se modernize.

Futuramente, ver-me-ão opor determinantemente a este tipo de taxação, mas é importante não esquecermos que a maquilhagem se inventou essencialmente para as mulheres feias...

Frases Livres - 3

"He who passively accepts evil, is as much involved in it as he who helps to perpetuate it."

Martin Luther King

A liberdade e a independência ganham-se e perdem-se todos os dias.

quinta-feira, junho 23, 2005

Prémio Liberal Europeu do Ano

...vai, obviamente, para Tony Blair.

Não porque seja o governante mais liberal de toda a Europa. Estou certo de que nos países de leste alguns dos seus líderes estão muito mais próximos de criar uma sociedade mais liberal e auto-responsabilizante do que Blair em terras de Sua Majestade. As taxas de IRS no Reino Unido são gritantes, pelo que não o poderei considerar o meu modelo de político.

Porém, o seu peso internacional torna-o num importante vector de alguns princípios liberais, em especial no seio da UE, a qual está semeada de políticas corporativistas: na agricultura, nos têxteis, na indústria automóvel, entre muitas outras. Políticas proteccionistas não apenas em relação ao exterior da União, por via do estabelecimento de tarifas especiais ou de quotas, mas também no seio da própria União, pela existência de quotas de produção por país, numa espécie de plano quinquenal soviético. Políticas enclausurantes e atrofiadoras, cobardemente apoiadas pela maioria dos políticos, receosos da resposta popular em sede democrática, que apenas têm aumentado a degradação económica e social da Europa.

Pelo estado calamitoso da política económica e social da União e pelo seu peso institucional, Blair tem as condições para chamar os bois pelos nomes e servir, caso seja necessário, de bode expiatório das opções mais difíceis. Já o foi na questão iraquiana e duvido que o preocupe.

Blair é, neste momento, a única esperança de uma Europa mais liberal a curto prazo. O futuro o julgará.

quarta-feira, junho 22, 2005

Um mundo irreal - A pastelaria

Tive um sonho estranhíssimo sobre um mundo irreal. Foi bastante realista e lembro-me de pormenores de que, normalmente, não nos lembramos quando acordamos.
Era um país muito parecido com o nosso, ao nível das pessoas e do clima, mas a sociedade estava organizada de uma forma bastante diferente. Lembro-me, por exemplo, de estar cheio de fome...

Decidi entrar na primeira pastelaria que me aparecesse à frente, independentemente da sua qualidade. Eu queria mesmo era comer qualquer coisa. Mas tive de andar mais de 15 minutos até encontrar aquilo que presumi ser uma pastelaria, apesar de ter muito pouco a ver com as pastelarias a que estamos habituados. Parecia-se mais com uma repartição de finanças. Entrei, esfaimado, pela loja dentro e deparei-me imediatamente com um daqueles porta-senhas encarnados. Era preciso tirar senha? OK, seja, eu quero mesmo é comer. Saiu-me o número 58. Olhei para a frente e percebi que estavam mais de cinquenta pessoas antes de mim. Tudo bem, deve ser uma daquelas pastelarias concorridas, estilo Versalhes, mas como o balcão é grande, calculo que seja rápido. O cliente a ser atendido era o 05, pelo que tinha, de facto, 53 clientes à minha frente.

Passados quinze minutos, ainda só tinham sido atendidos doze clientes e eu começava a vociferar contra aquele país, onde não era possível comer um bolo ou uma sandes sem ter de perder uma hora numa fila. Pelo meio, tinha olhado para as paredes do estabelecimento, onde se encontravam folhas de papel que, aparentemente, serviriam para efectuar o meu pedido por escrito! Foi nesse momento que, não aguentando mais, abordei um outro cliente que estava a meu lado.

- Desculpe, mas porque é que precisamos de prencher este impresso para pedir alguma coisa?
- É por causa do controlo das calorias.
- Do quê? - pensei ter ouvido um enorme disparate.
- Do controlo das calorias. Eles controlam o que nós comemos.
- Os senhores do estabelecimento?
- Bom, não, o Estado.
- Então, mas eles têm de dar essa informação ao Estado?
- Mas em que mundo é que você vive, homem? Então a alimentação pré-fabricada não é exclusiva do Estado?
- ... - fiquei sem palavras. Tudo se encaixava agora. As semelhanças com uma repartição, o atraso no serviço, a pouca variedade de produtos... Lá comecei a preencher o papel. Logo no cabeçalho tinha uma série de dados relacionados com a minha identidade. Nome, Número de Identificação Alimentar, Índice de Massa Corporal. Não queria acreditar naquilo. Mas, como por magia, estes dados vinham-me à cabeça como se os usasse todos os dias...

Passados mais 45 minutos e estando já à beira do desmaio, chegou finalmente a minha vez. Dirigi-me ao balcão, já com tudo preenchido. "Uma bola de berlim e uma Coca-Cola". "Está a brincar comigo?", respondeu a balconista. "Porquê?" "Acha que isto é um supermercado privado ou quê? Queria luxos destes assim, não? Mais o quê, uma saladinha de frutas?? Olha-me este espertinho." "Então mas não tem nada disto? O que é que têm, então?" "Temos o que sempre tivemos, caro cidadão. Sandes de queijo, fiambre ou mistas e torradas, queques e bolos de arroz, leite ou sumo de laranja." "Um queque e um copo de leite, então." "Bom, mas vai ter de preencher novamente o impresso." "Pois, claro que sim..." - A fome era negra e, naquele momento, submeter-me-ia a qualquer coisa.

Faltava pagar. "Desculpe, quanto é?" "São, ora deixe cá ver, o seu Índice de Massa Corporal é de 30, são 20 cêntimos." O senhor com quem falara antes já me explicara que só havia 10 cafés naquela cidade, com 500 mil habitantes, sendo aquele a 8ª Pastelaria Municipal. Depois de perceber que era estrangeiro - ou que, pelo menos, estava completamente a leste do que se passava - disse-me também que todos os estabelecimentos de alimentos pré-cozinhados, como sejam pastelarias ou restaurantes, eram exclusividade do Estado. Todos não, porque tinham aparecido à menos de um ano algumas pastelarias privadas, após concurso público para aquisição de licenças, mas os preços eram astronómicos. Como tinham produtos únicos e eram só meia dúzia, impunham os preços que queriam. Quando uma pessoa tinha mesmo muita fome e não queria esperar, ia a uma pastelaria privada e pagava 10 euros por um bolo. Expliquei-lhe que, no meu país, os cafés eram detidos pelas pessoas, cada um se quisesse tinha a sua pastelaria ou restaurante, vendia os produtos que quisesse ao preço que quisesse. Ele não quis acreditar. "Então e as pessoas têm dinheiro para pagar os preços tão elevados?" "Bom, os preços são muito mais baixos, apesar de não serem subsidiados, como nas vossas pastelarias públicas. Há sítios mais baratos, outros mais caros, consoante os gostos e as possibilidades. Mas mesmo a tasca mais manhosa tem dez vezes mais produtos do que a vossa pastelaria pública."

Deixei o homem, de boca aberta, a pensar no que lhe tinha contado. Às vezes estamos tão envoltos pelas nossas realidades que nem conseguimos imaginar como elas poderiam ser diferentes... (continua)

terça-feira, junho 21, 2005

Frases Livres - 2

"Freedom is the right to choose, the right to create for oneself the alternatives of choice. Without the possibility of choice and the exercise of choice, a man is not a man but a member, an instrument, a thing."

Archibald McLeish (1892-1982), poeta e escritor norte-americano

domingo, junho 19, 2005

Leituras Livres - 1

"A Tentação Totalitária" - Jean-François Revel, 1976, Livraria Bertrand

"Amanhã, o Capitalismo" - Henri Lepage, 1978, Publicações Europa-América

"Amanhã, o Liberalismo" - Henri Lepage, 1980, Publicações Europa-América

Dois autores franceses que, num país com fortes tendências colectivistas e estatizantes e num período particularmente difícil em termos económicos e sociais, como foi a década de 70, apontaram o dedo às derivas socialistas, que à data incluiam conceitos tão ingénuos como os da auto-gestão (lembram-se do Alentejo?) e tão perigosos como os da nacionalização da economia.
Para que não voltemos a cometer os mesmos erros...

sábado, junho 18, 2005

Ideias Livres para Portugal - nº 1

Descentralização do controlo das escolas públicas

As escolas públicas de ensino básico, secundário e complementar devem ser rapidamente autonomizadas e o seu controlo deve passar para as mãos da sociedade.

Tal pode acontecer de várias formas, consoante a atractividade da escola. Deve ser criada uma sociedade de gestão individual de cada escola, cujo capital deve ser detido preferencialmente por empresas especializadas na gestão escolar, após um concurso público semelhante ao adoptado para as privatizações.

As escolas que não sejam consideradas interessantes pela sociedade/mercado, poderão ser detidas pelas freguesias, municípios ou outro tipo de estruturas associativas locais, podendo também ser encerradas caso tenha deixado de existir racionalidade económica na sua existência. Deve, por princípio, existir pelo menos uma escola de cada ciclo por município, mas tal racional deve ser a própria sociedade/mercado a analisar.Cabe às comunidades locais decidir sobre a instrução dos seus filhos. A sua participação no capital da escola é apenas uma das formas de exercer essa influência, existindo outras, muitas delas já existentes. Fundamental é permitir a cada escola definir, de acordo com a sua realidade, quais as melhores ferramentas de gestão do ensino.

A gestão dos recursos humanos passa, também, a ser uma função exclusiva das escolas, deixando de lado o actual modelo central "soviético" de distribuição dos professores pelo país. Cada escola será livre de escolher os professores que considerar mais adequados à sua realidade, como acontece com outros mercados de trabalho.

O financiamento das escolas pode ser efectuado através de um sistema de cheque-ensino, isto é, cada aluno tem direito a um dado montante que o seu encarregado de educação poderá utilizar livremente na escola que melhor lhe convier, acabando com o actual sistema, altamente castrador das liberdades individuais, que apenas permite, para uma residência, uma escola.

terça-feira, junho 14, 2005

Que União temos?

A União Europeia, ou melhor, uma parte significativa dos seus membros, vive hoje uma preocupante crise económica que começa a provocar algumas ameaças de ruptura social.

A dimensão do Estado, sempre crescente na segunda metade do século XX, tornou-se hoje insustentável. As suas redes sociais criaram situações de desincentivo à produção que, a par de um envelhecimento natural da população não acompanhado de um aumento da idade da reforma, contribuíram para o desequilíbrio entre as receitas e as despesas e para uma situação de défice crónico.

O mesmo Estado Social propiciou, com o tal desincentivo à produção e, por arrasto, ao trabalho, uma sociedade de lazer, com imenso tempo livre. Como ainda havia uma parte da população que ia produzindo, apoiada pela investigação e pela tecnologia de ponta, dos melhores produtos em todo o mundo e a redistribuição de riqueza ia passando o dinheiro destas empresas e cidadãos para os bolsos dos restantes cidadãos, o consumo disparou. Sempre que ia faltando dinheiro, aumentava-se a carga fiscal, sufocando os produtores aos poucos para não degradar a vida dos restantes. Isso conduziu, em parte, ao desequilíbrio da balança comercial da Europa em relação ao resto do mundo.

Aos poucos, a competitividade da Europa foi sendo corroída por políticas destruidoras de riqueza. Outros países, fora do eixo Europa-América-Japão, foram-se libertando de amarras ideológicas que os impediam de dar um salto em frente, como a China e a Índia. Antes delas, já a Coreia do Sul e Taiwan haviam explicado a quem quisesse ouvir como se podia criar uma grande potência económica, com evidentes benefícios para os seus cidadãos. A Europa conseguiu, porém, atrasar o desenvolvimento destes países com políticas proteccionistas que serviam também, ironicamente, para corroer ainda mais a sua competitividade de longo prazo, desincentivando a inovação nas indústrias subsidiadas, sendo o melhor exemplo disso o sector agrícola europeu.

Os últimos quinze anos foram, porém, dramáticos para a Europa pois esta não aproveitou o último ciclo de crescimento económico para efectuar as reformas que se afiguravam como fundamentais à sustentabilidade da economia europeia. Ao invés, acelerou ainda mais os factores negativos, aumentando o consumo - e endividamento - das famílias, aumentando as regalias sociais e a subsidiação da economia, isto é, tapando as feridas com pus. Com a última crise económica disparou o desemprego e as reformas antecipadas, diminuiram os resultados das empresas e, naturalmente, as receitas do Estado, dando origem às situações de défice conhecidas.

A maioria das reformas necessárias, de índole liberal, têm sido enunciadas a medo por alguns agentes políticos e económicos. O capitalismo, sistema económico exigente mas maravilhoso, só origina os seus efeitos positivos quando aplicado a mercados livres e abertos, que propiciam a concorrência e beneficiam os consumidores. Infelizmente, a Europa, por razões ainda por explicar, manteve sempre uma visão romântica da esquerda que a tem impedido de compreender as razões profundas do nosso declínio.

Confrontados com a luz que lhes vai entrando na Caverna, preferem recuar e esconder-se ainda mais na escuridão...

Frases Livres - 1

"A wise and frugal government, which shall restrain men from injuring one another, shall leave them otherwise free to regulate their own pursuits of industry and improvement"

Thomas Jefferson, First Inaugural Address, 1801

segunda-feira, junho 13, 2005

O que eles nos fizeram...

Quem ler amanhã muita da comunicação social portuguesa, se não conhecer minimamente a história contemporânea do nosso país, correrá o risco de pensar que se perdeu não apenas uma das principais figuras do universo político do pós-25 de Abril mas um dos pilares do nosso regime, um baluarte da democracia, um símbolo da liberdade. Pelo menos a julgar pelos rodapés e reportagens dos telejornais, a democracia está de luto e o país mais pobre...

Ora o país está, de facto, cada vez mais pobre mas deve-o em boa parte a Cunhal e seus muchachos, como o previamente desaparecido Vasco Gonçalves, que andaram a brincar às revoluções com o dinheiro dos outros e, não bastasse isso, deixaram um legado socio-cultural aterrorizante, que nos continuará a perseguir. Dissecando a liberdade em social e económica - se é que faz algum sentido separar, no campo teórico, uma pessoa da sua propriedade... - verificamos que os comunistas pouco ou nada contribuiram nos últimos trinta anos para o seu reforço em Portugal. Senão, vejamos:

1. Fomentaram a perseguição de pessoas e bens, apoiando a ocupação de propriedades privadas por parte de terceiros, destruindo famílias inteiras e expulsando do país, a semelhança do que havia sido feito pela Inquisição, boa parte do nossos recursos humanos e materiais.

2. Levaram a cabo, por via indirecta, a nacionalização da economia portuguesa, arrasando a fileira de alguns produtos e provocando atrasos irrecuparáveis noutros.

3. Perseguiram ideologicamente muitos daqueles que deles discordavam, expulsando-os dos seus empregos, humilhando-os, insultando-os com epítetos ainda hoje usados por alguns dos seus dirigentes em relação a uma parte significativa do espectro político português.

4. Dominaram o status quo da Função Pública, através dos seus braços armados sindicais, continuando hoje a minar muitas das mudanças essenciais ao desenvolvimento económico e social do país, não só no Estado mas em todas as empresas entretanto devolvidas - vendidas a peso de ouro - ao mercado, como parte da banca, a PT, a EDP ou a Galpenergia, tendo pelas mesmas razões afastado, ao longo destes trinta anos, o fundamental investimento estrangeiro.

5. Controlaram o sub-sistema de educação pública, condicionando o conteúdo dos manuais escolares e as nomeações para os Conselhos Directivos das escolas, tentando formatar, de modo soviético e orwelliano - e, com muitos, conseguindo... - as futuras gerações, na qual me incluo.

6. Inundaram de militantes a Administração Pública, Central e acima de tudo Local, discriminando, uma vez mais, os não simpatizantes da causa e criando nos municípios um lastro insustentável.

São imensos os casos de diminuição das liberdades acima citados. Muitos desses crimes foram sendo remediados com o passar do tempo, mas não anulados, pois o tempo não anda para trás. Outros, mantém-se impunes hoje e os seus estragos sentidos na nossa pele todos os dias.

É por tudo isto importante escrever correctamente a história de Portugal. E esse é um trabalho diário que cabe a todos aqueles que amam a liberdade e se sentem chocados ao verem-na ser usada como porta-estandarte de quem tão mal sempre a tratou.

domingo, junho 12, 2005

Quando os Vascos eram Gonçalves

Morreu Vasco Gonçalves. Não me aquece nem me arrefece. Hoje, não era ameaça alguma para a nossa liberdade, apenas um fantasma que me entrava anualmente pela televisão. Mas a sua curta passagem pelo poder deixou-nos um legado que, infelizmente, durará muito para além da sua morte.

Este homem ajudou a destruir o tecido económico e social de Portugal, um atraso que ainda hoje continuamos a pagar e do qual tão cedo não nos veremos livres. Aproveitando-se de uma população ignorante e pobre, fruto de, pelo menos, cem anos de governo a alternar entre o messiânico e o populista, alimentou as suas expectativas com um tropel de asneiras de inspiração marxista-caudilhista ainda hoje visíveis nas palavras e actos de dirigentes como Hugo Chavez.

Não trabalhou sozinho, obviamente, muitos dos que o apoiaram estão hoje espalhados por várias instâncias públicas e privadas deste país e pela sociedade civil, continuando a minar o futuro de Portugal, acreditando ainda em coisas tão disparatadas como o trabalho voluntário, a expropriação de propriedade privada e o Pai Natal. São, ainda hoje, uma muralha de aço contra o desenvolvimento económico e a criação de riqueza e uma das causas da nossa incapacidade para dar o salto.

O PREC foi, de facto, uma revolução que varreu este país, deixando marcas profundas na mentalidade dos portugueses, que passados trinta anos continuam a ver os criadores de riqueza como capitalistas sanguinários e frios e a estratificar a sociedade em "nós, os pobres, eles, os ricos", mesmo que ganhem 3000 euros por mês e vão passar férias a Cuba todos os anos. Esta pseudo-ideologia primária, que se aproveita de alguns dos piores sentimentos do ser humano - a inveja, a mesquinhez e a preguiça - impedir-nos-á, enquanto existir, de saírmos deste purgatório.

Vasco, foi bonita a festa, pá... podias era ter ficado para a limpar...

sábado, junho 11, 2005

Meditações sobre o referendo ao Tratado Constitucional

Cada vez mais considero que só havia uma maneira digna e intelectualmente honesta de aprovar o Tratado Constitucional. Num único referendo a nível europeu, com um único resultado europeu.

Qual o tipo de maioria necessária para a sua aprovação seria uma decisão a tomar a priori, mas querer uma Europa unida e tratá-la com base nas fronteiras que se pretende fazer desaparecer tem algo de errado. E opormo-nos a uma eleição solidária soa, no nosso país, a julgamento em causa própria, visto a nossa dimensão ser pouco expressiva no total dos 25 membros. Somos o que somos, valemos o que valemos. Um cidadão, um voto, esta é a minha democracia. Ou a aceitamos ou não vale a pena existir UE.

Alguns dos detractores desta alternativa consideram que, deste modo, um estado ficará para sempre preso às decisões da maioria dos europeus, perdendo a sua independência democrática. O modo de isso não acontecer seria permitindo a secessão, por referendo nacional, sendo para tal necessária a mesma maioria que a definida para as aprovações a nível europeu. Uma nação continuaria a ser soberana em relação à sua permanência na União, diminuindo a sensação de "trela" que hoje muitos europeus sentem.

Mas o que mais custa ver na discussão desta questão é o cenário de fundo em que ela ocorre. Não tenhamos muitas dúvidas de que, caso a situação económica da Europa fosse a mesma de há 10 anos, não haveria dificuldade em aprovar o Tratado Constitucional. Mas não é. A Europa - pelo menos de Berlim para cá - é hoje um continente parado no tempo, refém do seu passado, mártir de um século vinte carrasco que lhe roubou as jóias, a feriu gravemente e depois, para que não percebesse, a encheu de analgésicos, cujos efeitos começam agora a desaparecer.

O que mais choca nesta Europa é a decadência da sua economia, a rigidez das suas instituições, o egoísmo assustado dos seus habitantes. A máscara politicamente correcta caiu por falta de dinheiro e soluções. Mimados e frustrados, não passamos hoje de um continente à deriva, composto por nostálgicos e xenófobos, à esquerda e à direita, sem querermos aceitar as soluções dolorosas que se nos colocam e fazendo como era ensinado no filme Pesadelo em Elm Street para escapar das garras de Freddy Kruger - ou do tigre asiático: fechar os olhos e dizer "Tu não existes." Mesmo no filme, nem sempre resultava...

A esta velha Europa veio-se juntar agora uma nova Europa, fresca e vivaz, competitiva mas também ingénua, com - imagine-se... - taxas planas e segurança social privada, e com indíces de crescimento que fazem inveja aos velhinhos do Carvão e Aço. Esta nova Europa, dinâmica, deve ser vista como a nossa esperança e não o nosso ocaso. Mas foi esta mesma Europa que despoletou nos países mais ricos mas com mais problemas sociais por total incapacidade em gerar nova riqueza, fruto de décadas de políticas sociais e económicas erradas, um despertar doloroso e uma reacção de repúdio que culminou na vitória do Não em França e na Holanda. E por isso, custa-me congratular com esses resultados pois, apesar de não querer esta Europa, também não é isto que quero, este estranho pout-pourri de trotskistas e chauvinistas com o ideário político próprio de uma criança de 10 anos.

Por tudo isto, é fundamental que se crie um movimento de crítica ao Tratado numa perspectiva construtiva de desenvolvimento europeu e na promoção da desburocratização e da flexibilidade.

sexta-feira, junho 10, 2005

Uma razão de ser

O Ideias Livres foi criado em Setembro do ano passado, mas ficou congelado quase um ano.

Neste ano, muita coisa mudou no panorama nacional e internacional e, também, na blogosfera. O mundo ocidental tem vindo a divergir do mainstream "fim da história" que o caracterizou após a queda do bloco soviético, tendo-se vindo a reorganizar em dois grupos distintos.

Um, defensor do liberalismo económico e da força dos mercados, racional e pragmático na análise, optimista em relação ao futuro e à força da sociedade civil, com uma visão naturalista e, talvez por isso, darwinista da evolução das sociedades.

O outro, promotor de movimentos de reacção face às mutações sociais que vão sucedendo, utópico mas - ou por isso mesmo - pessimista, defensor da constante regulação do Estado, descrente da sociedade civil, que prefere continuar a ver como um permanente palco para a luta de classes.

Estes dois grupos, tão afastados ideologicamente entre si, dão depois origem a uma miríade de organizações que conseguem mesmo, em determinados casos, assumir posições aparentemente contraditórias e com ideias tanto de um grupo como de outro.

Esta luta ideológica, travada diariamente nos jornais, nas televisões, nos escritórios e nas casas, tenderá a extremar-se com o aumento dos problemas económicos e sociais e dela dependerá a realidade da Europa e a qualidade de vida dos nossos descendentes.

Eu estou claramente do lado do primeiro grupo. Acredito nas pessoas e na sociedade civil, na sua capacidade criativa individual e colectiva, que dá origem a todo o tipo de organizações e que é parte integrante do património genético da Humanidade. Acredito num mundo realmente livre e responsável, em que essas capacidades não sejam desincentivadas.

As ideias livres estão em todo o lado, nascem na sociedade diariamente e tentarei mencionar as que considerar relevantes.

Também as ideias presas, infelizmente, abundam e promovem a ignorância intelectual, tornando aqueles que nelas caem um pouco menos livres e, por isso, devem ser desmascaradas.